Leia e assine a Carta COP30 das Favelas!
Ao longo do primeiro semestre de 2025, mais de 100 integrantes e aliados da Rede Favela Sustentável, no Rio de Janeiro e fora, construíram esta carta-manifesto, uma Carta Aberta de Favelas, Comunidades Tradicionais e Marginalizadas de Todo o Mundo para as Autoridades Globais Presentes na COP30: bit.ly/AssineCartaCOP30.
Agora a carta está pronta para receber assinaturas de toda Rede Favela Sustentável e grupos aliados! Assine quanto pessoa ou quanto organização/coletivo. Caso assine quanto organização não esqueça de nos enviar a logo para incluirmos na carta final. Iremos colher assinaturas de todo o Brasil e do mundo, lançando a carta em coletiva de imprensa no Rio de Janeiro em outubro e em Belém, na COP30, em novembro.
Carta Aberta de Favelas, Comunidades Tradicionais e Marginalizadas de Todo o Mundo para as Autoridades Globais Presentes na COP30
Coloquem as Favelas, Comunidades Tradicionais e Marginalizadas no Centro das Decisões Climáticas Globais
agosto de 2025
Introdução
Quase todas as nações têm pessoas vivendo em favelas: uma característica estrutural e recorrente da urbanização. Unidas pela insegurança da posse, habitações precarizadas, alta densidade populacional, falta de água potável e de infraestrutura de saneamento, essas comunidades concentram as pessoas mais vulnerabilizadas em relação a diversos tipos de riscos sociais e ambientais em grande parte do mundo.
Através desta carta aberta, manifestamos nossas demandas enquanto crias, coletivos, organizações, movimentos, e aliados de favelas e pessoas vivendo em moradias inadequadas e em situação de risco climático, sofrendo com racismo ambiental, em todo o mundo. Conclamamos por justiça climática como objetivo central das discussões na COP30!
Apesar de sua centralidade, nenhuma COP tem colocado as favelas no centro das discussões de forma a refletir sua importância vital para o nosso sucesso na mitigação da crise climática.
Favelas são a primeira, a mais comum e essencial forma de moradia de populações deslocadas em todo o mundo. E no contexto da emergência climática, são elas que correm o maior risco de sofrerem os efeitos das inundações, deslizamentos, secas, ondas de calor e incêndios urbanos. Apesar dessas condições adversas—causadas principalmente pela negligência do poder público—favelas também são caracterizadas por um conjunto de fortalezas e potencialidades, que passam despercebidas. São resilientes e evoluem com flexibilidade em resposta a oportunidades e desafios, enquanto produzem cultura, fomentam a economia solidária e ajudam seus moradores a realizar, pouco a pouco, o direito à cidade.
Sem os moradores de favelas no centro das discussões climáticas, estamos negligenciando saberes, práticas e potências fundamentais para enfrentar esta crise. Um quarto da população urbana mundial não é desprovida de ideias, soluções, conhecimentos e sabedoria. Pelo contrário, apesar da negligência histórica do poder público, seus moradores são, fundamentalmente, "solucionadores de problemas". Sem apoio governamental, enfrentam desigualdades estruturais e, consequentemente, constroem políticas públicas na prática: desenvolvendo respostas diretas às suas necessidades, através de redes de solidariedade e propostas alternativas sustentáveis. Quem presta mais atenção percebe que suas comunidades são espaços de produção de soluções, as primeiras a reagir de forma solidária, como nos resgates dos eventos climáticos extremos. E reagem de forma organizada, com ações preventivas, dentro das suas possibilidades, por mais árduas que sejam as circunstâncias. Esses territórios não são apenas vulnerabilizados: são centrais. A justiça climática só será possível com sua participação ativa, reconhecimento e protagonismo.
Reivindicações
É a partir dessa perspectiva que as organizações e indivíduos abaixo-assinados do Brasil, juntamente com diversas comunidades e aliados de todo o mundo, conclamam os líderes nacionais, regionais, municipais e empresariais presentes na COP30 a:
Colocar os assentamentos mais vulnerabilizados de seus países no cerne das decisões climáticas, reconhecendo que cuidar dos mais vulnerabilizados significa cuidar de todos. Isso exige garantir que diferentes vozes desses territórios sejam incluídas na tomada de decisões, em especial diferentes tipos de comunidades, mulheres e matriarcas, jovens e idosos, grupos étnicos com menos acesso ao poder, etc. As soluções climáticas para as favelas só podem ser construídas junto com a população: os planos municipais de enfrentamento às mudanças climáticas necessitam da total participação das comunidades. Assembleias de cidadãos devem ser cuidadosamente criadas e apoiadas. Uma vez estabelecidas, os governos locais onde estão inseridas deverão acatar as decisões por elas tomadas, estas decisões sendo incluídas na governança climática de suas cidades.
Investir, em nível local, em formas que promovam e valorizem a população local, seus saberes ancestrais e populares, e sentimento de pertencimento (inclusive à terra e à natureza), priorizando os mais vulnerabilizados nos investimentos. Isso inclui mercados comunitários, educação ambiental climática popular, soluções e tecnologias sociais descentralizadas que valorizem as soluções idealizadas, adaptadas e implementadas pela própria comunidade. Mudar o foco para investimentos que fortaleçam a capacidade de todos atenderem às suas necessidades de formas que respeitem os sistemas naturais—e não as falsas soluções que fomentam processos centralizados de planejamento e políticas impostas de cima para baixo—permitirá multiplicar processos eficazes de maneira saudável, equitativa e emancipatória, por meio do compartilhamento e da realização do poder entre todos nós. Isso exige aprender com a natureza: ecossistemas descentralizados são mais resilientes. Tomando como exemplo as favelas do Rio, podemos encontrar soluções exemplares correlatas com todos os ODS, tais como: tetos verdes para resfriamento, hortas verticais, cooperativas solares comunitárias, polo de juventudes, quintais produtivos, agricultura urbana e periurbana, sistemas agroflorestais, tecnologias sociais em saneamento ambiental, museus comunitários, rodas de memória intergeracionais, cultivo de ervas, comunidades centradas em pedestres e termos territoriais coletivos para a regularização fundiária.
Os fundos climáticos devem priorizar Soluções Baseadas na Natureza e fomento para energias renováveis em favelas. Após desastres climáticos, esses territórios precisam ser compensados, incluídos no Fundo de Resposta por Perdas e Danos (FRLD). Em relação aos créditos de carbono, deve ser considerado como investir estes recursos em projetos desenvolvidos dentro e pelas comunidades.
Garantir que favelas e comunidades consolidadas—aqueles que já construíram uma história e identidade comuns, laços com a terra em que vivem e uns com os outros—e que desejem permanecer, possam fazê-lo com segurança e acesso a serviços de qualidade. Isso inclui, em especial: água potável, saneamento (que vai além unicamente do esgoto coletado e tratado, e inclui corpos hídricos limpos, drenagem, coleta—com educação—de resíduos e reciclagem comunitária, etc.), mitigação de riscos com base na natureza, orientação técnica e materiais para moradias seguras, alimentos nutritivos com ênfase na segurança e soberania alimentar, centros de saúde integral (que tratem inclusive da ansiedade climática), escolas com projetos e programas de educação ambiental climática popular, transporte público, plantio de árvores e mitigação de ilhas de calor, soluções de energia solar comunitária, espaços compartilhados onde crianças e adultos possam atender necessidades coletivas (como reuniões, hortas, eventos culturais, etc.), e segurança da posse—o que poderá ou não ser alcançada por meio de direitos de propriedade individual privados.
Garantir, nos assentamentos em que o reassentamento for desejado: moradia segura e adequada (definida por segurança, acesso a serviços, custo acessível, habitabilidade, acessibilidade, localização e respeito às referências culturais da comunidade), próxima a oportunidades econômicas relevantes e com garantia dos mesmos serviços de qualidade e direitos listados no item 4 acima. O estado precisa ter previsão de terras a serem disponibilizadas com razoável grau de acessibilidade para reassentamento de comunidades atingidas por eventos climáticos bem como recursos financeiros de fundos climáticos para a reconstrução da habitabilidade e dos modos de vida.
Investir em comunidades rurais, indígenas, quilombolas, caiçaras e outras comunidades tradicionais de forma a respeitar e valorizar seus saberes, costumes, sabedoria e vínculo com a terra e com o meio ambiente, reconhecendo esses laços de maneira a gerar um orgulho autêntico e condições reais de permanência e cuidado com esses territórios, culturas, tradições e economias.
Conclusão
Todos se beneficiarão trabalhando juntos dessa forma. As soluções climáticas precisam vir da linha de frente das comunidades locais que vêm catalisando estratégias desenvolvidas por elas próprias. Essas soluções exigem uma participação efetiva e a integração de todos os seres humanos.
Há apenas cinco anos, todos nós passamos, juntos, por uma pandemia global. Assim como ocorre com a crise climática, as favelas foram as mais impactadas. A Covid-19 deixou evidente que estamos todos interligados: o que acontece em qualquer lugar do mundo afeta a todos nós. Também percebemos, com nitidez, que somos somente tão fortes quanto os mais vulnerabilizados entre nós. E que comunidades com laços de solidariedade e moradias estáveis são determinantes.
A emergência climática irá gerar desalojamentos em série: tanto migrações e imobilizações, em um nível nunca antes experimentado, por todo o mundo. São violências contra a dignidade humana.
Nenhuma decisão que afete o clima deve ser tomada sem que os maiores impactados—e as soluções por eles trazidas—estejam presentes no processo decisório.
Nossa crise climática foi produzida pelo mesmo sistema dominador, centralizado, hierárquico e verticalizado que hoje governa as tomadas de decisão sobre o clima. No entanto, a solução para essa crise precisa envolver a todos. Todos nós fazemos parte da solução deste novo momento que o mundo enfrenta. Cobramos dos tomadores de decisão, justiça climática e econômica, frente aos reais impactos das mudanças climáticas em nossas comunidades. Nada que nos impacta deve ser decidido sem nós! Não existe futuro sem que as populações historicamente marginalizadas estejam no centro das decisões climáticas globais.